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Apenas 2,6% dos indígenas que vivem em Sorocaba falam idioma originário, aponta Censo

Veja quais são as 10 ínguas indígenas mais faladas no Brasil Apenas 2,6% dos indígenas que vivem em Sorocaba (SP) utilizam o próprio idioma originário, de...

Apenas 2,6% dos indígenas que vivem em Sorocaba falam idioma originário, aponta Censo
Apenas 2,6% dos indígenas que vivem em Sorocaba falam idioma originário, aponta Censo (Foto: Reprodução)

Veja quais são as 10 ínguas indígenas mais faladas no Brasil Apenas 2,6% dos indígenas que vivem em Sorocaba (SP) utilizam o próprio idioma originário, de acordo com o Censo 2022, divulgado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em outubro deste ano. Dos 808 moradores que se declararam indígenas na cidade, apenas 188 conseguiram identificar o povo de origem da família. O levantamento também registrou 13 diferentes idiomas indígenas em Sorocaba, falados por apenas 21 pessoas. 📲 Participe do canal do g1 Sorocaba e Jundiaí no WhatsApp Idiomas indígenas falados em Sorocaba Na cidade, o Censo identificou indígenas de 49 diferentes comunidades. A mais numerosa é a Guarani Kaiowá, com 19 pessoas que se declararam pertencentes ao grupo. Logo em seguida, aparece a comunidade Guarani, com 18 moradores autodeclarados. Comunidades indígenas O professor de linguística histórica Thomas Finbow, do Departamento de Linguística da Universidade de São Paulo (USP), explica que a família linguística Tukano Oriental engloba pelo menos 16 línguas. "Devem ter de 10 a 16 línguas no ramo Tukano Oriental. Elas são faladas na bacia do Rio Uaupés, no norte do estado do Amazonas. Já as línguas do ramo ocidental da família Tukano ficam na Colômbia. É a mesmo coisa com o Tupi, que é o nome de uma língua que era falada no litoral brasileiro quando os portugueses chegaram, e fica dentro do ramo Tupi-guarani, que é o maior subgrupo da família Tupi, que contém outros nove ramos. São acidentes históricos." No Brasil, há 295 línguas indígenas, presentes em cerca de um quinto dos municípios. Esse número é 7% maior que o registrado em 2010 (274 línguas) e, de acordo com o IBGE, uma das explicações é a mudança na metodologia de coleta, que permitiu a desagregação de etnias que antes estavam agrupadas. O estado de São Paulo reúne mais de 24 mil indígenas pertencentes a 272 etnias. Nas cidades da região de Sorocaba, quase 600 moradores se declararam indígenas. Já na região de Jundiaí, o número chegou a 637 pessoas. Reginaldo Trema Ramos, estudante de engenharia florestal na UFSCar, campus Sorocaba, é falante das línguas Tuyuka e Tukano. Apesar de fazer parte da comunidade Tuyuka, a proximidade geográfica com comunidades Tukano permitiu que o estudante aprendesse o idioma. "Idioma Tukano falo e entendo muito. Aprendi quando comecei a entrar na escola, a escola ficava em uma comunidade dos Tukano, por isso aprendi. Falo também o meu idioma Tuyuka, que aprendi criança, pois [é] o local onde cresci e a comunidade falava, o idioma nunca se perdeu naquele local", aponta. Além dos idiomas falados por ele, Reginaldo também compreende o idioma Itana, língua falada pela mãe do estudante. "Idioma Itana eu não falo, mas entendo tudo, minha mãe nunca conversou comigo em Tuyuka, acho [que] por isso cresci entendendo dois idiomas ao mesmo tempo", aponta. Ao g1, o jovem enviou a frase "oi, tudo bem?" nos três idiomas compreendidos por ele: Sã añuimʉ (em Tuyuka); Né añutimʉ (em Tukano); Nã kenatimʉ (em Itana). E a resposta: "tudo bem": Añuniã (em Tuyuka); Añuni (em Tukano); Kenaña (em Itana). Reginaldo Trema Ramos, 38 anos, fala duas línguas indígenas: Tuyuka, da sua comunidade, e Tukano, que aprendeu na escola Arquivo pessoal O Censo identificou dois falantes da língua Tikúna em Sorocaba. Predominantemente falado no Amazonas, o idioma está presente na região da fronteira entre Brasil, Peru e Colômbia, sendo a maior comunidade de falantes de uma língua indígena do Brasil, conforme Thomas. "E é uma língua isolada, isso quer dizer que não tem parentes vivos, não tem vínculo com nenhuma outra língua falada no mundo." A estudante de turismo na UFSCar, no campus de Sorocaba, Enita Rosindo Manoel, de 26 anos, é da comunidade Tikúna, na região de Santo Antônio do Içá, município do interior do Amazonas. Na universidade, a jovem conheceu outros três falantes da língua. A estudante conta que já ensinou aos colegas da universidade algumas palavras e que, para ela, continuar falando a língua materna é uma maneira de não deixar a história de seu povo ser totalmente apagada. "Para mim, manter a língua significa preservar algo que é muito mais que idioma. É manter viva a memória dos ancestrais, a história de um povo, a forma como ele vê o mundo. A língua carrega modo de pensar, humor, jeitos de sentir, formas únicas de se relacionar com a natureza, com o sagrado e com a comunidade. Quando uma língua se perde, parte de um povo desaparece junto", afirma Enita. Em Tikúna: Moê naca tcha'ã i jornal portal g1 Sorocaba naca i nha'a natica meê'tchiü tchona peã'ü na nü'ü tchiu'üca natchiga e tchauga nawatchide'a'ü, nhumatchi tchaucümagü. Tchataeütchi na pemaã nü'ü tchiu'ü na ngemaâcü na tatchigaüca nhumatci na poraü'ca i torü cuagü, moê naca tcha'ã na tchoü perü i'nüe'ü. Em português: Agradeço ao portal g1 Sorocaba pela oportunidade de compartilhar um pouco da minha língua materna e da minha cultura. Fico muito feliz em contribuir para que nossos saberes continuem vivos, valorizados e respeitados, obrigado pela escuta e pelo espaço. Enita Rosindo Manoel, de 26 anos, é da comunidade Tikuna e estuda turismo na UFSCar de Sorocaba (SP) Arquivo Pessoal 'Cultura e o povo resistem' "Eikobé! Xe-rera Bricia, ixé-a nhe'eng tupi-nhe'enga abé." Traduzido do Tupi para o português, a frase significa: "Olá, me chamo Bricia, falo língua tupi também." Bricia Tupinikim, que se apresenta utilizando a língua de seu povo, tem 29 anos e estuda engenharia florestal na UFSCar de Sorocaba. Na cidade onde a indígena estuda, foram identificadas pelo Censo quatro pessoas da etnia dela, os Tupiniquim, que habitam três Terras Indígenas no norte do Espírito Santo. Todas estas situam-se no município de Aracruz, cidade onde Bricia nasceu. O Tupi foi a língua indígena mais difundida no litoral brasileiro na época da chegada dos portugueses e, por muito tempo, serviu como língua geral na colônia, segundo o professor. A jovem ressalta que o Tupi foi um dos idiomas mais apagados desde a colonização. "A língua Tupi foi a que mais sofreu com o quase apagamento cultural que o povo Tupinikim enfrentou, mas hoje ela é ensinada nas escolas indígenas que têm no território, desde o maternal até o ensino médio. Para mim, continuar falando a língua é uma forma de resistência. Sempre que uma criança é ensinada nas escolas, significa que a cultura e o povo resistem." Para os filhos da jovem, o contato com o idioma maternal só é possível por meio dos ensinamentos da mãe. "Ensino aos meus filhos as palavras mais usadas, canto musiquinhas na língua. Como eles estão morando comigo aqui [interior de São Paulo], não têm acesso se não por mim", aponta a indígena. Bricia Tupinikim, estudante de engenharia florestal na UFSCar de Sorocaba (SP), aponta impactos que a língua Tupi sofreu desde a colonização Arquivo pessoal Resgate de idiomas indígenas O professor de linguística histórica explica que a presença de indígenas e, consequentemente, de seus idiomas, no interior de São Paulo, local distante das comunidades, pode ocorrer pela busca por oportunidades de emprego ou estudo no sudeste. "A diáspora indígena pelo Brasil é muito grande. A principal motivação é por oportunidades de trabalho, de emprego ou de estudo. Isso acontece independentemente se são indígenas ou não indígenas. A maior parte dos brasileiros fica procurando melhores oportunidades." Ele também comenta que há línguas indígenas que chegaram a deixar de ser usadas, mas que hoje passam por processos de retomada. "As pessoas estão aprendendo, estudando aquela língua, fazendo cursos, fazendo gramática, juntando material para voltar a falar a língua. Quando a língua realmente não tem mais falantes nativos, o restage é feito por meio de textos históricos, por exemplo, gramáticas de missionários para tentar 'ressuscitar' a língua como uma língua falada na comunidade." LEIA MAIS: Povos indígenas preservam tradições e fortalecem ancestralidade no interior de SP Com o 'ouro da terra' entre os ingredientes, indígena da comunidade Tuyuka ensina a preparar cardápio que une aldeias e cidades Comunidade indígena do interior de SP busca preservar a língua nativa: 'Herança cultural', diz cacique A inclusão de aulas de línguas indígenas em escolas localizadas em regiões de comunidades tradicionais também é relativamente recente e pode ser um dos fatores que ajuda a explicar o aumento no número de falantes de alguns idiomas. "Até muito recentemente não era possível receber algum tipo de ensino em língua indígena nas comunidades. É muito recente isso de os indígenas poderem ter o filho falando a língua materna das suas comunidades. Quando os jovens vão para a escola, têm contato com o português. Mas, apesar de alguns municípios brasileiros terem línguas indígenas como co-oficiais, o uso prático destes idiomas ainda tem efeito, em documentos oficiais, atendimentos públicos. Eu tomo como um fator que dificultou muito a manutenção de línguas indígenas", analisa. Apesar do histórico de apagamento, muitos termos do português brasileiro têm forte influência dos idiomas originários, principalmente da língua Tupi, como aponta o professor Thomas. "Basicamente, o vocabulário usado para falar de fauna e flora no Brasil, com exceção de algumas palavras, como onça e anta, o restante tem origem indígena. Jacaré, piranha, sucuri, jaguatirica, além dos nomes de muitos pássaros, como tiê e maritaca. Todas essas palavras derivam de línguas específicas, especialmente do Tupi, predominante no litoral." Veja mais notícias da região no g1 Sorocaba e Jundiaí VÍDEOS: assista às reportagens da TV TEM